Falta de leitos e longas esperas por atendimento agravam a crise na saúde mental pública no Brasil
As internações de adolescentes e jovens de 13 a 29 anos devido a estresse e ansiedade aumentaram 136% entre 2013 e 2023, de acordo com dados do Ministério da Saúde. Em termos absolutos, o número de casos saltou de 690 para 1.629. Essas hospitalizações ocorrem em última instância, em casos graves que incluem sintomas como psicoses, tendências autolesivas e ideação suicida.
Especialistas alertam que esses números estão subnotificados, devido à falta de leitos em centros especializados e hospitais gerais, além de se referirem apenas aos atendimentos no sistema público. Mariana Rae, especialista em Saúde Pública e coordenadora do Instituto Cactus, explica que a demanda por tratamento de saúde mental é muito superior à oferta no Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo ela, 70% dos casos de transtornos mentais começam na adolescência, antes dos 25 anos.
O tempo de espera para o primeiro atendimento em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) e o encaminhamento a um Centro de Atenção Psicossocial (Caps) pode variar entre três meses a um ano e meio. Rae enfatiza que a demora dificulta a prevenção do agravamento dos transtornos mentais, e que a hospitalização acaba sendo o último recurso.
A especialista também destaca que a falta de investimentos no setor é um fator crítico, agravado pela Portaria GM/MS nº 3.588/2017, que reduziu a transparência no orçamento federal para saúde mental, dificultando o monitoramento dos recursos destinados à área. Essa portaria foi revogada em junho de 2023, mas seus efeitos ainda são sentidos. De acordo com um relatório do Instituto Cactus e do Instituto de Estudos para Política de Saúde (IEPS), a mudança tornou mais difícil identificar os recursos destinados à saúde mental, complicando ainda mais a situação.
Anna Lucia Spear, psicóloga e professora da pós-graduação no Instituto de Psiquiatria da UFRJ, também reforça a necessidade de ampliar os recursos destinados à saúde mental no Brasil. Ela aponta o uso excessivo das redes sociais como um dos fatores que contribuem para o aumento dos casos de estresse e ansiedade na geração Z, devido à pressão para se adequar a padrões de beleza e comportamento impostos por essas plataformas.
Em resposta, o Ministério da Saúde informou que o governo federal investiu R$ 16,6 bilhões na Rede de Atenção Psicossocial (Raps) em 2023, e que 200 novos Centros de Atenção Psicossocial estão em construção para garantir o atendimento à população. A previsão para 2024 é de um investimento de R$ 17,1 bilhões para esses serviços, mas especialistas alertam que esses esforços podem não ser suficientes para atender à crescente demanda.
No Brasil, o SUS oferece uma rede de serviços para apoio psicológico e psiquiátrico, incluindo UBSs, Caps, Unidades de Acolhimento (UA), Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), o Programa de Volta para Casa (PVC), Unidades de Pronto Atendimento (UPA), SAMU, Hospitais Gerais e Centros de Convivência e Cultura. As UBSs são o ponto de partida para o tratamento, onde o paciente passa por uma triagem e é encaminhado para o serviço mais adequado. Dependendo da gravidade dos sintomas, o tempo de espera para iniciar o tratamento especializado pode ser prolongado, agravando o quadro do paciente.
O Instituto Cactus classifica os casos de transtornos mentais em três categorias: leves (sintomas de depressão, ansiedade ou síndrome do pânico), moderados (com quadros psicóticos, alucinações ou delírios) e graves (ideação suicida, que requer atendimento de emergência). Embora o paciente possa buscar uma UBS de forma urgente, o tempo de espera para o encaminhamento a um Caps ou para atendimento especializado é longo, variando de meses a mais de um ano, dificultando a prevenção e o tratamento adequado.
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